por Revista A Palavra Solta
Fotografia: CAMILA SVENSON/ El País
De campeão mundial de Ginástica em 2015, superando lendas como Diego Hypólito, e o vislumbre de uma carreira promissora, Ângelo Assumpção, quatro anos mais tarde, começaria a viver um dos episódios mais injustos do esporte nacional: após denunciar ataques racistas de colegas de equipe no clube em que treinava e na seleção brasileira, o ginasta foi afastado dos treinamentos e das competições. Um hiato caro a um atleta de alta performance no auge de sua carreira, mas um silenciamento ainda maior quando pensado à luz de nossa História.
A Palavra Solta, nesta edição #20, entrevista o ginasta.
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APS - Ângelo, você sempre foi visto como uma promessa da ginástica brasileira. Como foi a sua chegada até esse esporte?
AA - Acredito que foi uma construção até ser um atleta de alto rendimento e ser uma promessa. Tudo começou muito cedo ao seis anos, onde brincava em casa pulando nas coisas e escalando o portão. Nunca fui proibido de brincar pela minha mãe, ela sempre orientou para que eu tomasse cuidado e isso foi fundamental pra desenvolver a vontade de continuar. Meus tios sempre foram próximo da minha criação, o Zé Carlos (tio) sempre teve um olhar clínico por mundo do esporte e pensou que eu tinha talento pra algo relacionado a ginasta. Na época passou no rádio que teria uma peneira no centro olímpico de ginástica, fiz o teste e acabei treinando durante um ano, oque foi o primeiro contato com a ginástica.
APS - Ainda muito novo você chegou em um dos clubes mais tradicionais de São Paulo, localizado numa zona rica da cidade, para praticar um esporte que ainda mantém um corte de classe. Isso já era bem demarcado desde o início da sua trajetória?
AA - Eu percebia que estava em uma ambiente completamente diferente de onde vinha, por muitas vezes não sabemos verbalizar estes recortes por não ter o letramento ou por ainda estar construindo este letramento. Com o tempo fui entendendo como poderia desenvolver a minha ginástica e a lidar com todas essas adversidades que enfrentamos.
APS - Um dos pontos mais revoltantes do episódio de discriminação que sofreu, foi que além de toda a exposição, e o que isso poderia lhe acarretar psicologicamente, ainda que vítima de um preconceito racial, você acabou jogado no ostracismo dos patrocinadores. Como foi isso? Qual a dimensão simbólica desse gesto de exclusão por parte dos dirigentes e dos patrocinadores? AA - É muito triste saber que mais uma vez estamos falhando como sociedade, estamos perdendo um tempo precioso de evoluir e transformar o futuro com ações efetivas no presente. Não podemos mais admitir atos racistas, seja do indivíduo que comete ou a estrutura que reforça a impunidade colocando a vítima como culpado. APS - Você é ainda muito novo, mantém sua forma física, e sempre foi visto como muito promissor. Ainda existe a vontade de retomar a carreira? Seria possível retomar a prática profissional e ampliar esse debate dentro do esporte? AA - Meu objetivo é voltar pro esporte, batalhando muito pra que ocorra. Só quero exercer o meu direito de trabalhar igual a todos!
APS - Nos Jogos Olímpicos de Tóquio, além de uma marca histórica para o país, podemos acompanhar a supremacia das mulheres, sobretudo das mulheres negras, na equipe olímpica. Quase metade das medalhas conquistadas foi por negros, isso tem um impacto direto na autoestima de uma série de jovens pelo Brasil. Mesmo depois de entender o jogo cruel que pode haver nos bastidores, o que você diria a um jovem negro entrando no mundo do esporte? AA - Nunca foi tão dito a importância da saúde mental, este seria o primeiro pedido pra quem queira ser um atleta de alto rendimento. Busque representatividade na sua modalidade, tenha objetivo, trabalhe duro, tenha resiliência para enfrentar as adversidades, seja feliz e sonhe grande.
Obrigado, Ângelo.
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