poema inédito lido por Flávio Morgado
olhos de odè
ao Marcelo Reis de Mello
Recado ao Poeta, Paulo César Pinheiro
semicerrar a amizade
como um gesto de caça
a si mesmo, uma trama
que a rua protege se
for injusto o tributo.
por isso,
propõs retorno à encruzilhada
de um padê que ficou mal cozido
e de joelhos ao rei desta mercância,
o coração é a quinquilharia mais barata
da principal rua da Glória: o perdão.
trair o trauma na rasura deste encanto,
põe à prova, à bala e ao gesto,
não estes dois amigos – que isto aflui:
numa aposta contra todas as fichas
de cafetões de uma sinuca miliciana;
e dela sair correndo,
depois da pergunta errada –
rio de janeiro.
é sobre trair a viga frágil
deixando ecos afetivos
a quem, por estrutura,
encontrar a mesma
gagueira emocional
que há entre dois homens:
isso sim, inaugura poema.
o resto é só o mesmo.
paúra, peia, pancada,
dinamarca, ubatuba;
outros gestos mais elaborados
do recalque, da disputa;
outros mais distraídos:
como estratégia de philia,
ainda manter-se inimigos.
nos amamos como permitem
a integridade poética e a
fatalidade de um soco
que jamais nos daríamos:
porque custamos, um ao outro,
essa cena de uma beleza renhida –
rodeados de borboletas brutas
enredados nas saias do desprezo,
ainda abrimos o peito ao desaviso
dessa flecha...
aceitamos errar. e no arco desta presença
entramos na mata, de onde melhor posso
ver
como é bonito
que nossos olhos tenham a mesma cor.
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